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segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016


A Criatividade inventa, transforma e renova num movimento contínuo em direcção ao Belo. No entanto, nem sempre o nosso pensamento e o nosso olhar estão dispostos a encontrar esse ideal nas mais pequenas coisas. Facilmente caímos numa rotina de sentimentos que nos cega e que nos impede de vislumbrar a verdadeira beleza. É, então, necessária a coragem para transpor essa limitação imposta por nós e, sobretudo, pelos outros que também se esqueceram da importância desse ideal. Sempre que se vive susceptível a uma opinião exterior, a criatividade desaparece. A Beleza desta vida está em voltar a encontrar o caminho para a essência, e de novo para a Criatividade.
quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016


Leitura e Escrita

Iniciei este blogue em 2011. Sempre gostei de ler, numa maior ou menor regularidade consoante o bem-estar mental que o dia-a-dia permite, e para escrever tinha o meu moleskine que me acompanhava há uma década num exercício de escrita muito libertador, sem qualquer intenção de estar exposto. Esta forma de escrita num blogue, que nada tem de novo, alia imagem e fotografia, o que a torna muito apelativa. De certa maneira, voltei a dar atenção a este espaço, quase só meu, pois considero que ler é importante, mas essa experiência quando é acompanhada pela escrita singela de umas poucas palavras, torna os livros ainda mais presentes na nossa vida e memória. É uma homenagem ao livro e ao autor que sinto que presto, com um retorno ainda maior para mim enquanto leitora!

Book Review - Memorial de Maria Moura






Rachel de Queiroz, Memorial de Maria Moura. 
Lisboa, Livros do Brasil, 1994, 482 p. 


[Primeira leitura iniciada e concluída em 2016, através do empréstimo de um leitor.]

A leitura da obra de Rachel de Queiroz, Memorial de Maria Moura permitiu conhecer uma personagem feminina muito interessante. Maria Moura é uma jovem mulher que se encontra dividida entre dois mundos: um mundo tradicional, passivo, frágil, que ela conhecera na meninice e que se personifica no papel da própria mãe, e em oposição um mundo novo que Maria Moura vai construir para si e para o qual terá que assumir características masculinas, que lhe traz à memória muitos ensinamentos do pai. As ditas memórias de Maria Moura começam a ser tecidas quando esta personagem decide tomar o seu próprio destino nas mãos, o que nesse mundo implicava passar a fronteira do que era considerado legal, ainda que um pouco incipiente, para viver numa espécie de marginalidade que a imensidão do território do Brasil do século XIX permitia. Daí em diante, Maria Moura empreende uma verdadeira obra de construção da sua vida e de uma casa fortaleza, que irá proteger muitos outros que também se encontram numa situação de fuga. Este livro intitula-se como um memorial, e de facto o passado tem aqui um papel muito persecutório. Sobre isto podemos ler numa das passagens do Beato Romano esta conclusão:

"Não, o homem feliz não é o que não tem camisa, como o da história que Padre Barnabé nos contava, no seminário. O homem feliz é o que não tem passado. O maior dos castigos, para o qual só há pior no inferno, é a gente recordar. Lembrança que vem de repente e ataca como uma pontada debaixo das costelas, ali onde se diz que fica o coração. Alguém pode ter tudo, mocidade, dinheiro no bolso, um bom cavalo debaixo das pernas, o mundo todo ao seu dispor. Mas não pode usufruir nada disso, por quê? Porque tem as lembranças perturbando. O passado te persegue, como um cão perverso nos teus calcanhares. Não há dia claro, nem céu azul, nem esperança de futuro, que resista ao assalto das lembranças." p.188

 Para além da história de Maria Moura, encontramos outras vidas simples, que me emocionaram, como as dos que viviam em situação de escravatura com todo o sofrimento que implicava, em especial a separação de pais e filhos. Após ultrapassar as vicissitudes iniciais, Maria Moura irá enfrentar uma grande luta interior que vai desenterrar todo aquele mundo do passado. Percebe-se como a vida esconde várias tipos de lutas e, neste aspecto, a personagem revela fragilidades que poderão fazer esmorecer o entusiasmo pela história ou, pelo contrário, nos levarão a reflectir sobre as contradições próprias do ser humano. Gostei muito da escrita de Rachel de Queiroz e quero conhecer melhor a obra desta escritora, que chegou a assinar com o pseudónimo de Rita de Queluz!
sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016
Leitura para Fim de Semana 




"Tinha muito com quem se brigar nesse mundo afora - porque eu já estava convencida de que, nesta vida, quem não briga pelo que quer, se acaba." p. 121


quinta-feira, 28 de janeiro de 2016





No dia em que se evoca o centenário do nascimento de Vergílio Ferreira, aqui fica o programa das actividades comemorativas em Gouveia: 

Para mim, este autor está na prateleira de autores portugueses que me acompanha desde os 16 anos, mas que eu adiei a sua leitura por achar que era nova demais e não iria compreender. (Nesses anos duvida-se de tudo, até das capacidades de leitura...) Vinte anos depois, ainda continua por ler. Este ano tenho que enfrentar essa estante sem ideias pré-concebidas! 




O Sonho

Pelo Sonho é que vamos,
comovidos e mudos.
Chegamos? Não chegamos?
Haja ou não haja frutos,
pelo Sonho é que vamos.

Basta a fé no que temos.
Basta a esperança naquilo
que talvez não teremos.
Basta que a alma demos,
com a mesma alegria,
ao que desconhecemos
e ao que é do dia-a-dia.

Chegamos? Não chegamos?

-Partimos. Vamos. Somos.

Sebastião da Gama, Pelo Sonho é que vamos. Lisboa, Portugália Editora, 1953, 42 p.
sábado, 8 de fevereiro de 2014

Book Review - A máquina de fazer espanhóis



Imagem retirada de: www.joaninhaoulibelinha.blogspot.pt

valter hugo mãe, A máquina de fazer espanhóis. Carnaxide, Objectiva, 2010, 287 p.

Requisitado na Biblioteca João Soares


Numa altura em que VHM promove o seu mais recente livro "A desumanização", fiz a minha primeira leitura deste autor. É um livro que aborda um tema complexo pois fala-nos do sentimento de perda, que vem com o envelhecimento e a morte. Aborda ainda a amizade e o amor numa altura em que a ausência física é mais acentuada. Aos 84 anos, o sr. Silva perde a esposa, Laura, e a família decide colocá-lo num lar. A história desenrola-se a partir do encontro que o sr. Silva irá fazer com os outros utentes do lar, os que já lá viviam e outros que chegam. Destaca-se um grupo de amigos e conhecidos com histórias de vida impressionantes, entre os quais o sr. Pereira, o sr. Esteves (sem metafísica, inspiração de um poema de Fernado Pessoa) e Anísio Franco. Ora se o Esteves "conheceu" o poeta, eu conheci o verdadeiro A.F., conservador do MNAA! Que surpresa curiosa neste livro!
Gostei de ler este livro e de descobrir o significado do título! Destaco a entrevista que este autor deu para o Jornal de Leiria, quando por cá passou em Dezembro!

"A utilidade está na comunidade..."

"nestes modos, sem pensar demasiado, para que o futuro lhe parecesse possível, joão esteves entrou mais uma vez na tabacaria alves e comprou o jornal a ordens do tio. entrou na tabacaria de sorriso educado, cumprimentou o senhor fernando pessoa que ali estava de breve conversa com o dono do estabelecimento e depois cumprimentou o próprio dono do estabelecimento e pediu o jornal de sempre, com a iluminação de sempre, que era sobretudo uma beleza jovial que adivinha dos seus traços privilegiados até dignos de um aristocrata qualquer. a genética, pensaria mais tarde joão esteves, tem destas coisas curiosas, põe-nos com beleza de nobre a passar as fomes dos miseráveis.[...] e joão esteves saiu da tabacaria sem mais nada, inconsciente de que plantara no terreno fértil da criatividade de fernando pessoa um poema eterno." p.82

"um dia essa saudade vai ser benigna. a lembrança da sua esposa vai trazer-lhe um sorriso aos lábios porque é isso que a saudade faz, constrói uma memória que nós nos orgulhamos de guardar, como um trofeu de vida. um dia, senhor silva, a sua esposa vai ser uma memória que já não dói e que lhe traz apenas felicidade. a felicidade de ter partilhado consigo um amor incrível que não pode mais fazê-lo sofrer, apenas levá-lo à glória de o ter vivido, de o ter merecido." p. 91

" sabe, acharmos que salazar é que arranjaria isto, que ele é que punha esta juventude toda na ordem, é natural, porque temos medo destes novos tempos, não são os nossos tempos, e precisamos de nos defendermos. quando dizemos que antigamente é que era bom estamos só a ter saudades, queremos na verdade dizer que antigamente éramos novos, reconhecíamos o mundo como nosso e não tínhamos dores nas costas nem reumatismo. é uma saudade de nós próprios, e não exactamente do regime e menos ainda de salazar."

"deus é uma cobiça que temos dentro de nós. é um modo de querermos tudo, de não nos bastarmos com o que é garantido e já tão abundante. deus é uma inveja pelo que imaginamos. como se não fosse suficiente tanto quanto se nos põe diante durante a vida. queremos mais, queremos sempre mais, até o que não existe e não vai existir. e até inventamos deus porque temos de nos policiar uns aos outros, é verdade. é tão mais fácil gerir os vizinhos se compactuarmos com a hipótese de existir um indivíduo sem corpo que atravessa as casas e escuta tudo quanto dizemos e vê tudo quanto fazemos. [...]os homens acreditam em deus porque não são capazes de acreditar uns nos outros." p. 225